Telefone
42.99867-9943

E-mail sinduepg@sinduepg.com.br

AUDIÊNCIA PÚBLICA DENUNCIA RISCOS DE AGROTÓXICOS À SAÚDE

15/08/2019 às 07:08


A Audiência Pública realizada pelo Ministério Público do Trabalho, nesta quinta-feira, 15, trouxe alertas sobre a utilização de agrotóxicos na região. O evento aconteceu no Teatro Pax, em Ponta Grossa, e faz parte da agenda do Fórum Contra os Agrotóxicos, que atua há mais de 15 anos em Curitiba tratando da problemática do uso dos venenos agrícolas e impactos na saúde pública.

“Decidimos que era importante que viéssemos para o interior, para onde pudéssemos ter abrigo para conversar com todas as pessoas e esclarecer a sociedade dos problemas ligados aos venenos agrícolas”, assinala Saint-Clair Santos, procurador de Justiça. Saint-Clair atua na área ambiental e coordenou o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente entre 2004 e 2016.

“O tema diz respeito a todos nós, a nossa vida, que é o uso absurdamente abusivo de agrotóxicos na alimentação e na água. É importante que possamos fazer esse debate e, mais do que isso, tomar providências para que não tenhamos a continuidade de uma situação que a cada dia é mais grave. Neste ano foram mais de 260 agrotóxicos liberados e todos aqui sabemos das consequências disso”, destaca o Deputado Estadual Tadeu Veneri. “Se nós não tomarmos nenhuma providência, talvez o relógio do tempo não seja favorável daqui 5 anos. É preciso urgente que se tome providências e audiências como essa nos ajudam muito a encontrarmos um caminho”, acrescenta.

Durante a Audiência, a agricultora Lídia Maria do Prado contou aos ouvintes o impacto dos agrotóxicos em sua vida, que causou uma doença que a faz viver impossibilitada de caminhar e em constantes experiências de dor. “O agrotóxico me condenou a essa vida miserável. O tratamento cada vez fica mais caro, é difícil. Em 2015, o médico disse que eu era uma paciente que não teria mais cura. Em 2017, uma ação na Justiça se decidiu minha aposentadoria por invalidez, mas eu já não tinha mais nenhuma forma de trabalho. Foram anos até o diagnóstico, os sintomas acontecendo, eu estava alucinando, e os médicos não entendiam isso. Perderam-se anos da minha vida”, relata. “Qualquer pessoa pode ter os mesmos riscos. Nossa água e alimentos estão envenenados. Quem trabalha com veneno corre ainda mais riscos, porque os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) não são seguros. Eu usava o EPI e isso não garantiu que eu quase morresse. Hoje tenho minha vida e saúde completamente mudadas. Eu tenho que aprender a lidar com essa situação. Sou grata pela minha vida, porque minha saúde é um caos. Tive projetos, tive sonhos, que tiveram que ser interrompidos”, conta a agricultora.

“Chegamos a um momento de repensar. Não podemos querer tapar o sol com a peneira e dizer que não tem problema, que os agrotóxicos não fazem mal. Isso é uma vergonha. Eu sou professor do curso de Agronomia há 30 anos e é triste de ver posições de colegas formados na nossa Universidade de não querer compreender que existe um grave problema de contaminação de alimentos, da água, do ar. Isso é gravíssimo quando afeta a vida das pessoas”, destaca o professor Carlos Hugo Rocha, que faz parte de um grupo de trabalho na UEPG que tem foco na adequação ambiental. Ele deu detalhes sobre um estudo que analisa a presença de 27 agrotóxicos em cidades Paranaenses. “Praticamente todas as cidades do Paraná têm contaminação por agrotóxicos e, em alguns casos, chega a ter os 27 procurados (na análise)”, conta. “O Paraná tem condições de ser o grande produtor de orgânicos do Brasil, pela realidade do estado, potencial agrícola e oportunidade que temos para fazer isso. Precisamos de políticas públicas que incentivem isso”, defende.

A procuradora Margareth Matos alerta para o risco da alteração na classificação toxicológica e de rótulos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Antes todos os produtos tinham que ter em seus rótulos a caveira. Não tem mais obrigação para os que são considerados pouco tóxicos e improváveis de causar riscos. Isso obviamente impacta os trabalhadores rurais, nós sabemos do nível de escolaridade. A caveira é altamente instrutiva. Quando o limite é morte, a gente rebaixa o nível da discussão. Além da morte temos que destacar todos os outros perigos”, explica.

“A explicação da Anvisa é que estaria atendendo um padrão internacional. Produtos que causam úlceras, corrosão na pele, opacidade na córnea, estes eram considerados como extremamente tóxicos. Com a nova classificação, apenas os que causam morte quando ingeridos, inalados ou em contato com a pele, são identificados como extremamente tóxicos. 702 agrotóxicos eram classificados como extremamente tóxicos, agora são apenas 43; outros 55 passaram a ser considerados como altamente tóxicos; 75 moderadamente; 277 como pouco tóxicos; 253 foram considerados como improváveis de causar dano agudo; 5 sequer foram classificados e 4 não tiveram dados informados”, detalha a procuradora.

“Qual é o recado que pretendemos passar para as autoridades, quem decide o destino do nosso país e a política adotada? É intolerável que continuemos permitindo pulverizações aéreas, pois 70% dos produtos se perdem, contaminando água e solo. Também é inaceitável a contaminação da água de consumo humano, de alimentos e leite materno”, defende. A professora conta que 21 estudos brasileiros detectaram ao menos um resíduo de agrotóxico no leite humano, por excelência o melhor alimento, segundo a procuradora. Ela também demonstra que uma maternidade no Piauí constatou contaminação por Glifosato (agrotóxico) em 83,4% das amostras de leite materno. “Estamos expostos ao agrotóxico todas as horas, todos os dias”, afirma. 

Na Audiência Pública também foram apresentados estudos da professora Sandra Scheffer, do Departamento de Serviço Social na UEPG, que analisam os impactos dos agrotóxicos no cotidiano dos moradores das bordas do perímetro urbano de Ponta Grossa que, em grande parte, fazem divisa com fazendas da região. “O Município tem essa especificidade. O urbano e o rural têm relação de convivência, mas não pode ter uma relação de conivência. Temos que achar mecanismos, de acordo com o planejamento urbano e legislação, que realmente compreendam essa situação e que encontrem formas de minimizar essa situação que pode se agravar junto à comunidade”, defende.  “A cerca das casas é a área agricultável. Nessas famílias eles comentam que ao passar o agrotóxico mata não só o problema na agricultura ao lado, mas também o que produzem no quintal, e causa problemas de pele e respiratórios”, relata a pesquisadora.

“Quando perguntamos o que acontece, eles falam muitas vezes que é como se fosse uma neblina na hora em que passa a máquina colocando o produto”, conta. Segundo a professora, há relatos de que os moradores não conseguem sair de casa pois a respiração fica dificultada, além de causar dores de cabeça, náuseas e tontura. “Essa situação que a princípio pode ser uma coisa momentânea, na sequência, de acordo com pesquisas, pode se transformar em situações bem agravantes. Essa reclamação que pode parecer pequena pode se agravar”, defende.

A Professora mostra imagens das regiões limítrofes da cidade, onde há fazendas na divisa e, inclusive, uma Escola Municipal. “É uma escola que atendia inicialmente somente a região do Lagoa Dourada e com a construção de inúmeros conjuntos habitacionais lá, foi abraçando a demanda e hoje tem mais de mil alunos. A escola tem área com agricultura do lado”, conta.

O evento foi realizado pelo Ministério Público do Trabalho em parceria com a procuradora Margareth Matos e a assessoria do Deputado Estadual Tadeu Veneri.